O PRINCÍPIO DA INÉRCIA

Acho sempre alguma piada aos comentadores do fenómeno político, quando estes referem que os altos níveis de abstenção ficam a dever-se à inépcia das campanhas eleitorais e à vacuidade das propostas apresentadas.

Não é que tenha como adquirido o facto de que todas as propostas terem sido substanciais e prospectivas. Porém, imagino que os resultados não seriam significativamente diferentes no caso de nos virmos a confrontar com campanhas úteis, válidas, imaginosas e positivas.

Parece-me existir um dado que os comentadores sistematicamente ignoram. Esse dado pode ser referido como "o princípio da inércia". O sistema político está montado, flui com normalidade, representa uma divisão de trabalho e de tudo isto resulta que o cidadão comum opta filosoficamente ... por não optar. É mas fácil, mais cómodo e menos exigente.

O caso português é típico. Os portugueses viveram longos períodos de história política sem que tivessem a estopada de fazerem escolhas. Habituaram-se a que alguém, alguma misteriosa Entidade, algum grupo de divindades decisivas, escolhesse por eles. Desta maneira, sobrava muito mais tempo para as rendas de bilros, para os falatórios de vão de escada, para os piqueniques campestres e para o jogo da bola. Queira-se ou não, a verdade é que uma boa parcela dos nossos compatriotas encontrou, dentro de parâmetros desta natureza, as condições requeridas a uma vida medíocre, sim, mas conformadamente feliz.

Pensar de maneira consistente sobre o que quer que seja é tarefa árdua. Exige concentração, pede motivação e impõe esforço. Ora, tudo isto é uma maçada insuportável para quem "tem mais que fazer". Por isso, os eleitores deste torrão luso exigem aos políticos que cumpram a parte deles, mas sem que venham chatear. Tratem , isso sim, de fornecer ao eleitorado aquilo que tal eleitorado deseja : uns escândalozitos para comentários de fim de semana e uns pretextos para a argumentação da "falta de vergonha" e de "patriotismo".

Essa coisa de obrigar as pessoas a votar é que não pode ser. É uma insuportável violência

Imagem retirada da net

Amadeu Homem