Do Uso da Força à Sensatez do Comando

Luis-Fraga2.png

Era eu jovem e dizia-se um provérbio que rezava assim: “Queres conhecer o vilão, mete-lhe a vara na mão”… Pois é, dêem poder a quem dele não sabe fazer uso e se julga impune e logo perceberão o seu carácter!

Nas Forças Armadas (em quaisquer, de qualquer país) o poder da hierarquia mostra, quase sempre, o carácter de quem manda, trate-se de alguém com baixa graduação ou do chefe supremo de todos os exércitos.

Há quem leia os regulamentos militares do modo que lhe agrada, que mais satisfaz o seu ego sem levar em conta os egos alheios. Há quem faça dos regulamentos castrenses uma espécie de “Bíblia” não interpretável quando se trata de aplicá-la aos outros, porque, se está em causa a sua pessoa, todas as interpretações são possíveis e devidas.

Os treze tripulantes que se recusaram ao cumprimento de uma ordem ignorante e, talvez, criminosa, por desconhecer o estado técnico do navio, não podem ser liminarmente acusados de insubordinação e falta de cumprimento do dever militar. Eles, com lealdade, informaram o comandante do vaso de guerra, sobre as razões da sua recusa. Razões técnicas que o comandante devia conhecer melhor do que ninguém. Razões que deveriam ter levado o comandante a assumir a responsabilidade de recusar a missão perante quem a ordenou.

Os sargentos e as praças, ditos “revoltosos” agiram com lealdade e frontalidade perante quem de direito e a Marinha, pela boca do seu Chefe de Estado-Maior, toma a imediata decisão de repudiar e configurar a acção daqueles militares como uma insubordinação.

Se a atitude destes militares foi a de insubordinação como devemos classificar, no âmbito da mesma Armada, a atitude do imediato e da oficialidade da fragata Gago Coutinho, comandada pelo capitão-de-fragata Seixas Louçã, na manhã do dia 25 de Abril de 1974? Um comandante que não foi frontal e lealmente informado de que estava a haver uma revolução, e se viu perante a recusa de obediência dos seus oficiais que nem coragem tiveram para lhe dar voz de prisão? Para quando, postumamente, o CEMA manda fazer justiça a um oficial que, sozinho, teve de tomar decisões que iam contra as determinações do Estado-Maior da Armada e, ao mesmo tempo, lidar com a deslealdade e falta de coragem de quase toda a oficialidade do navio? Se há vontade de cumprir rigorosamente os regulamentos num suposto caso de insubordinação colectiva, então, que se tenha a hombridade de se fazer justiça a um Oficial e Comandante que, sozinho, ponderadamente, foi tomando as atitudes que a sua consciência lhe ditou, evitando um caos no Terreiro do Paço. Embora isto se tenha passado num tempo em que o Senhor Almirante CEMA era um menino, espero que, agora, com a mesma galhardia com que foi ao Funchal, reponha o bom nome e boa reputação do Comandante Seixas Louçã. Isso era sensatez de comando.

Luís Alves de Fraga