VOZES DE FANTASMAS CONTAM PARA A DEMOCRACIA?

SANCHO32

 

A Câmara Municipal de Coimbra anunciou, com alguma pompa, a sua intenção
de transformar os Serviços Municipalizados de Transportes Urbanos de
Coimbra (SMTUC) numa empresa municipal, mais exactamente no dia 14 de Junho de 2024. No entanto, deixou claro que essa transformação só avançaria caso surgisse uma proposta vinda dos trabalhadores.
Para isso, foram realizadas reuniões com os representantes dos sindicatos, mas, curiosamente, estes não acharam necessário comunicar aos trabalhadores, em tempo útil, as intenções da câmara. A informação acabou por chegar aos trabalhadores através de terceiros, o que parece ser um retrato fiel da transparência do processo.

Mais tarde, num plenário organizado pelo Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local e Regional, Empresas Públicas, Concessionárias e Afins (STAL), todos os trabalhadores presentes rejeitaram por unanimidade a mudança dos SMTUC de serviço municipalizado para empresa municipal. A mensagem foi clara: os trabalhadores não querem a mudança.

Mas eis que, num golpe de teatro, a Câmara Municipal de Coimbra anunciou
um estudo para a conversão dos SMTUC, afirmando que a iniciativa foi
solicitada por “uma dirigente” durante uma reunião, e supostamente por
indicação dos trabalhadores. Até ao momento, ninguém sabe quem é “esta
Dirigente” misteriosa, nem se conhecem os trabalhadores que alegadamente
apoiaram esta transformação. Parece que, neste processo, as vozes dos
verdadeiros interessados são ignoradas em favor da voz de fantasmas que não têm nome nem corpo.

Os trabalhadores dos SMTUC têm fortes motivos para se opor a esta mudança.
Vendo como o início do fim do transporte público em Coimbra como serviço público social e solidário, especialmente dos serviços a localidades com poucos habitantes, mas idosos; do transporte para pessoas com mobilidade reduzida; transporte escolar, e outros essenciais ao concelho, mas que dão mais prejuízo que lucro. Sendo que a lógica é de bem estar para a população e não o do lucro.
Pois a legislação é clara: se uma empresa municipal der prejuízo, tem de ser extinta ou privatizada, o que ameaça diretamente o princípio da mobilidade urbana, vital para a cidade.

É curioso, contudo, que apesar de a câmara contar com uma vereadora doutorada em transportes, a gestão dos SMTUC tenha sido um desastre.
Parece que as universidades, apesar de entregarem diplomas, não conferem competências nem experiência, mas apenas conhecimentos teóricos. Como diria um antigo primeiro-ministro socialista, “doutoramentos, qualquer um tira”, desde que tenha alguém para fazer o trabalho por nós.

Agora, aguardamos pacientemente que a Câmara Municipal de Coimbra tenha a decência de comunicar diretamente com os trabalhadores, em vez de preferir passar informações aos sindicatos ou à imprensa “comprada”, que, como sempre, se limita a fazer o que a câmara manda. Afinal, é o mínimo que se pode esperar numa cidade onde a transparência deveria ser uma prioridade, mas que, na prática, parece ser uma mera formalidade.

Em última análise, a solução para os SMTUC não passa pela criação de uma empresa municipal nem por substituir conselhos de administração como quem troca de camisa. A verdadeira solução passa por ter alguém competente à frente, que compreenda a realidade dos utentes, dos trabalhadores, da rede de transportes e da frota. Afinal, gerir transportes urbanos não se aprende num diploma, mas sim no terreno.

Sancho Antunes
Motorista