DESAFIOS E PERSPETIVAS NA REFORMA DO SISTEMA DE JUSTIÇA EM PORTUGAL

SANCHO18

 

No contexto do novo governo em Portugal, as promessas de revisão do sistema de justiça têm sido anunciadas como uma prioridade, visando aprimorar a eficiência e a equidade no acesso à justiça. Contudo, ao observarmos de perto as dinâmicas das autarquias locais, emergem desafios preocupantes que demandam uma abordagem urgente e eficaz.

Como funcionário público de uma autarquia em Coimbra, sinto-me compelido a compartilhar minhas reflexões sobre as lacunas e deficiências que afetam diretamente nossa realidade laboral e a integridade do sistema de justiça como um todo.

Um dos principais problemas que enfrentamos diz respeito à qualificação dos decisores nas autarquias. É alarmante perceber que, em muitos casos, indivíduos não devidamente preparados são responsáveis por tomar decisões que afetam diretamente a vida dos trabalhadores e o cumprimento das leis laborais. Essa falta de competência e falta de especialização contribui significativamente para a ocorrência de violações do Código do Trabalho, alimentando um ciclo de litígios e desconfiança institucional.

Além disso, a ausência de responsabilização por parte desses decisores perpetua uma cultura de impunidade que mina os alicerces da justiça e da transparência. Quando indivíduos negligenciam suas obrigações e não são devidamente responsabilizados por suas ações, cria-se um ambiente propício para o descumprimento sistemático das leis e uma perda de confiança por parte dos cidadãos nas instituições governamentais.

É igualmente preocupante observar casos em que as autarquias se recusam a cumprir decisões judiciais, desafiando abertamente a autoridade do sistema de justiça e minando sua eficácia. Tal comportamento não apenas viola os princípios fundamentais do Estado de Direito, mas também enfraquece a legitimidade das autarquias e sua capacidade de servir os interesses da comunidade de forma justa e equitativa.

No entanto, a problemática não se restringe apenas às dinâmicas internas das autarquias. A exclusão dos funcionários públicos do sistema de tribunais de trabalho agrava ainda mais a lentidão na resolução de disputas laborais, sobrecarregando os tribunais administrativos e prejudicando a eficiência do sistema de justiça como um todo.

Diante desse cenário complexo e multifacetado, torna-se imperativo adotar medidas concretas e abrangentes para promover uma reforma significativa no sistema de justiça em Portugal. Primeiramente, é crucial investir na formação e capacitação dos decisores nas autarquias, garantindo que possuam o conhecimento necessário para tomar decisões éticas e em conformidade com a legislação vigente.

Além disso, é fundamental estabelecer mecanismos claros de responsabilização, de modo a garantir que aqueles que violam as leis e os direitos dos trabalhadores sejam devidamente responsabilizados por suas ações. Isso envolve não apenas a imposição de sanções adequadas, mas também a promoção de uma cultura organizacional que valorize a integridade e o respeito pela lei.

No que diz respeito aos tribunais administrativos, urge promover uma revisão das políticas que excluem os funcionários públicos do acesso aos tribunais de trabalho, visando garantir que todos os trabalhadores, independentemente de seu estatuto, tenham igualdade de acesso à justiça. Isso pode incluir a implementação de procedimentos simplificados e a redução das despesas judiciais, a fim de facilitar o acesso dos trabalhadores a mecanismos eficazes de resolução de disputas.

Por fim, é essencial promover uma cultura de transparência e responsabilidade em todas as esferas do governo, reafirmando o compromisso com os princípios do Estado de Direito e garantindo a confiança dos cidadãos nas instituições democráticas.

Resumindo, a reforma do sistema de justiça em Portugal não pode ser vista como uma mera formalidade, mas sim como um imperativo moral e ético. Somente através de uma abordagem abrangente e colaborativa, envolvendo o governo, as autarquias, os trabalhadores e a sociedade civil, poderemos construir um sistema de justiça verdadeiramente justo, eficiente e respeitoso dos direitos humanos e laborais.
É fundamental reconhecer que os funcionários públicos merecem ter os mesmos direitos de acesso à justiça que os trabalhadores do setor privado. Embora desempenhem funções distintas, sua contribuição para o funcionamento do Estado e para o bem-estar da sociedade é igualmente valiosa. Portanto, qualquer disparidade no acesso à justiça entre esses dois grupos é não apenas injusta, mas também contraditória aos princípios de igualdade e equidade que devem reger uma sociedade democrática.

Os funcionários públicos enfrentam desafios únicos em seu ambiente de trabalho, muitas vezes lidando com questões sensíveis e complexas que requerem uma abordagem legal e judiciária adequada. Negar-lhes o acesso aos tribunais de trabalho e outros mecanismos de resolução de disputas é negar-lhes uma ferramenta essencial para proteger seus direitos e interesses legítimos.

Além disso, ao garantir que os funcionários públicos tenham os mesmos direitos de acesso à justiça que os trabalhadores do setor privado, estamos fortalecendo os pilares da democracia e do Estado de Direito. Todos os cidadãos devem ser tratados com igualdade perante a lei, independentemente do setor em que trabalham ou da natureza de seus empregadores.

Portanto, ao promover uma reforma do sistema de justiça que inclua os funcionários públicos, estamos não apenas corrigindo uma injustiça evidente, mas também fortalecendo os fundamentos de uma sociedade justa, democrática e inclusiva. É hora de reconhecer plenamente os direitos dos funcionários públicos e garantir que eles tenham acesso igualitário e justo à justiça, em consonância com os princípios democráticos e os padrões internacionais de direitos humanos.

Sancho Antunes