O estudante da Universidade de Coimbra em finais do séc. XIX

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«(…), os estudantes não estão mais adiantados; ao envergarem a capa e
batina, apossam-se do velho espirito de classe da época em que o clericus
vivia na bambochata dos goliardos e da tuna, dos sopistas e martinets, e
eil-os durante esses annos da formatura entregues com todo o vigor e audácia
da mocidade aos arruidos da troça.
(…)
Muitos dos costumes da vida académica de Coimbra são em tudo similhantes aos
das Universidades francezas do século XIV, taes como se propagaram para a
Allemanha e Suécia. Ainda hoje em Coimbra os estudantes se dividem em três
classes, correspondentes ás designações da Edade-média, os Recentiores a que
equivalem os Calouros; os Juniores ou Novatos; e os Seniores ou Veteranos,
que comprehendiam os terceirannistas ou pés-de-banco e ponte dos asnos, os
quartannistas ou candieiros, e os quintannistas.
As relações d'estas differentes classes seguem ainda os velhos ceremoniaes
da Edade-média, por uma tradição automática que nem os próprios doutores
hoje saberiam explicar.
(…)
No meio d'este tropel, os estudantes agrupam-se ainda pela antiga forma de
Nationes, a que chamara republicas, associando-se entre si os ilhéos, os
beirões, os minhotos, os alemtejanos e algarvios; nas suas choldras ha um
que faz de bolsa, seguindo a velha nomenclatura.
Aos estudantes vulgares dão-lhes o nome de musicos e cabulas, e ao que
conquistou a attenção do lente e é premiado, chama-se-lhe urso.
Esta notável persistência dos costumes escholares de Coimbra resente-se nos
methodos e no espirito do ensino da Universidade; ali subsiste o vicio
dialéctico e banal do tempo em que as Universidades eram exclusivamente
theologicas; ali impera a Cebenta, representante legitimo da época em que
não havia livros impressos, em que o lente era assim chamado porque lia pelo
seu caderno, em que o estudante copiava as apostillas, que se encebavam
passando de mão em mão.»

Teófilo Braga; 1892 (Vol. I): 210/215

Desenho: Traje académico - Coimbra séc. XIX

Enviado pelo Dr. João Baeta