As fogueiras coimbrãs (fogo) e a Fonte do Castanheiro (água)

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«A fogueira coimbrã não era fogueira, no sentido literal,
antes, sim, um mastro implantado no chão, de cujo topo irradiavam festões de verdura ou papel de seda para as paredes ou para outros mastros, cercado dum tosco gradeamento de sarrafos com buxo e um estrado para a música, iluminado a balões venezianas ou candeeiros no espaço cercado, em torno do mastro. Instalavam-se em locais recatados, sem prejuízo do trânsito.
Houve fogueiras célebres, como a do Largo do Romal, onde as tricanas apareciam de chinela, saia e blusa, «vicente» e mantilha; as da Arregaça e do Paço do Conde; as da Alta; e a da Rua Antero do Quental, iluminada a [bicos de] luz Wizard, com cadeiras reservadas - e frequentada, principalmente, por criadas de servir, sopas ou sopeiras.
Se as fogueiras começavam pelo Santo Antônio, o São João, porém, era, então, o nosso Santo querido, o nosso Santo do folguedo e de amores. Ao som das violas, das guitarras, das flautas, dos ferrinhos e, às vezes, de mais complicado instrumental, as tricanas dançavam, airosas, elegantes, leves, nos seus típicos trajares, pandeireta em punho. Eram seus pares os futricas, os estudantes, os magalas. Futricas vestidos de preto e boné de pala. Estudantes de capa e batina. Magalas fardados. Todos volteavam as tradicionais danças: populares, ao som das mais belas canções, das mais lindas barcarolas. Predominavam o Vira e o Estaladinho, este último sempre bonito, se marcado a preceito. Por vezes, os ensaiadores tentavam números novos de danças, com volteio cadenciado, cadeia e contra-dança, passando de mão-em-mão, e sempre havia cantigas novas, de origem popular ou popularizadas, musicadas por compositores locais, de subido mérito. O Calmeirão foi um ensaiador afamado.
Ao romper do dia, pelas 6 horas da manhã, ia-se, em festivo cortejo, até à Fonte do Castanheiro ou até à da Sereia, num rito tradicional, lavar a cara, para ficar mais fresco. Regressava-se de braço dado, mas sem aranzel, debandando aos poucos para as respectivas casas.
Por vezes, tomava-se no Mondego um banho santo.»

F. Falcão Machado; 1969: 452


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