Bíblia dos Jerónimos

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 EM 2005, NA TORRE DO TOMBO, quando eu era Director-Geral, FORAM EXPOSTOS OS EXTRAORDINÁRIOS VOLUMES DA BÍBLIA DOS JERÓNIMOS, por ocasião do lançamento do livro sobre os mesmos, publicado pela prestigiada editora Franco Maria Ricci e pela nossa Bertrand.

A obra quatrocentista tem 3060 folhas de pergaminho soberbamente iluminadas, divididas em sete volumes, foi acrescida pelo "Livro do Mestre das Sentenças" de Pietro Lombardo. A famosa Bíblia foi produzida pela oficina de Attavante degli Attavanti, de Florença, auxiliado pelos irmãos Gherardo e Monte del Fora, por encomenda do mercador florentino Clemente Sernigi, para ser oferecida a D. Manuel, então ainda só Duque de Beja. O contrato para a execução foi firmado, em 23 de Abril de 1494.

É uma das mais notáveis obras iluminadas do Mundo, e consequentemente do Renascimento, e pertenceu ao Mosteiro dos Jerónimos, oferecida pelo Rei Venturoso. Quando da primeira invasão francesa, em 1808, a obra foi roubada por Junot, e levada para Paris, mas voltaria para Portugal, graças à intervenção do rei Luís XVIII.

A edição, que facilitei ao máximo, para que tivesse a qualidade habitual da FMR foi um êxito, mas a exposição não ficou atrás, sendo o lançamento presidido pelo Senhor Cardeal Patriarca, que escreveu também o prefácio. Durante meses, os portugueses admiraram esta obra excepcional, e o lançamento foi um desfile do jet set e dos mundos da política nacional e da finança.

Deixo aqui uma parte da crónica do insuspeito João Benárd Costa que ele publicou no jornal Público: "Sometimes, there is God. But so quickly", diz Blanche DuBois na peça de Tennessee Williams "A Streetcar Named Desire", da única vez que lhe parece acontecer uma coisa boa. No meio de todas estas coisas tão pretas, tive essa sensação, na semana passada, na Torre do Tombo, quando fui assistir ao lançamento de "A Bíblia dos Jerónimos", edição da Bertrand e da Franco Maria Ricci. Assim, caída do céu aos trambolhões, apareceu naquele espaço uma obra magnífica, que só de ouvido ouvira e em que nunca tinha posto os olhos em vida minha. Os meus exageros habituais? Já vamos conversar, mas deixem-me que vos diga que o próprio cardeal-patriarca, que presidiu à sessão, foi o primeiro a falar de "êxtase". E certamente pesou bem a palavra e certamente não a empregou em vão.....

Nada fazia prever que o fossem, o que dilata a minha sensação de milagre e a minha convicção de que às vezes -- raríssimas é certo -- há divinas surpresas neste país. Neste caso, tão inesperado que, ainda há pouquíssimo tempo, confundi nesta coluna a Bíblia em causa com um hipotético Atlas de D. Manuel que só existiu na minha imaginação. Corrigido o erro, já posso passar ao assunto sem mais preâmbulos...

Pela primeira vez, mais de cinco séculos depois de ter sido copiada e miniaturada, a "Bíblia dos Jerónimos" está acessível, senão, como é evidente, na sua integralidade, através das suas páginas mais belas, sobretudo das oito páginas de grandes iluminuras com que abre cada volume (os "incipit")...

(Parte do artigo publicado por João Bénard da Costa,

a 17 de dezembro de 2004, no Público). 

Pedro Dias