Editorial 13-06-2019

O Leão e o Porco

Dizem para aí que o dinheiro não traz a felicidade, mas lá que ajuda muito, ajuda. Aliás, Pitigrilli sempre que ouvia tal anexim, hesitava, e, entre o risonho e o mal parecido, pospunha-lhe um “principalmente quando é pouco” .

Abro a caixa do correio, tiro a Visão” e, enfestando-me, salta-me à vista a foto de um Costa a alardear cagança, e uma frase alagada de prosápia: “Não podemos ter a ilusão de que passámos do inferno para o paraíso”.

Vaidade não lhe falta, não. O pior é qua a realidade desmente o primeiro-ministro, braço-direito de Sócrates, o primeiro do governo que, a enterrar-se, teve de chamar a Troika para tentar salvar o país da bancarrota. Não esqueço que, por mor disso, Passos Coelho teve de fazer suar as estopinhas aos portugueses, deixando o país a caminho do equilíbrio. Costa, com a sua geringonça podia ter feito muito mais; todavia, fez menos: actualmente, o povo vive pior que em 2015: a ilusão de uns míseros euros a mais na conta bancária não chega nem de perto nem de longe para colmatar a subida do custo de vida. Ainda a ajudar, por falta de investimento, os transportes públicos degradam-se; a “saúde”, por falta de investimento, está pelas ruas da amargura; a educação caminha de mal para pior, quer no investimento quer na exigência; a dívida pública ultrapassa o absurdo.

Todavia, nem tudo é mau: mercê da sobrecarga de impostos, a inflacção acentuou-se e o produto interno bruto subiu; a falta de investimento aproximou o défice do ponto zero… o que no caso português é um mau sinal.

A geringonça fez um “bom” trabalho; duvido que, fora do PS, haja quem queira governar este país pré terceiro-mundista.

Costuma falar-se em Eça ou de Pessoa; prefiro deixá-los em paz e lembrar Bocage, o melhor sonetista depois de Camões:

 

O rei dos animais, o rugidor leão,

Com o porco engraçou, não sei por que razão.

Quis empregá-lo bem para tirar-lhe a sorna

(A quem torpe nasceu nenhum enfeite adorna):

Deu-lhe alta dignidade, e rendas competentes,

Poder de despachar os brutos pretendentes,

De reprimir os maus, fazer aos bons justiça,

E assim cuidou vencer-lhe a natural preguiça;

Mas em vão, porque o porco é bom só para assar,

E a sua ocupação dormir, comer, fossar.

Notando-lhe a ignorância, o desmazelo, a incúria,

Soltavam contra ele injúria sobre injúria

Os outros animais, dizendo-lhe com ira:

«Ora o que o berço dá, somente a cova o tira!»

E ele, apenas grunhindo a vilipêndios tais,

Ficava muito enxuto. Atenção nisto, ó pais!

Dos filhos para o génio olhai com madureza;

Não há poder algum que mude a natureza:

Um porco há-de ser porco, inda que o rei dos bichos

O faça cortesão pelos seus vãos caprichos.

 (Bocage, in Fábulas) 

 

Uma boa semana.

 

ZEQUE

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