PODIAM AVISÁ-LO?

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A história é simples. Coimbra teve durante 40 anos dois Hospitais Centrais que, sem terem exactamente as mesmas valências, eram ambos Hospitais Gerais, e como tal assistindo as populações de Coimbra e da Região Centro, num total de cerca de dois milhões e trezentas mil pessoas. Cada hospital central deve ter na sua zona de influência à volta de oitocentos mil utentes, que foi o que esteve destinado ao Hospital dos Covões nesse período de tempo. A existência de outros hospitais grandes nessa sua zona de influência nunca tornou o seu apoio desnecessário, nem sequer pouco necessário, antes o oposto, para mais quando uma super-especialização criada na medicina e na cirurgia actuais afastou bastantes doentes de poderem ser seguidos em hospitais mais periféricos e com menos recursos.

Os dois hospitais gerais centrais de Coimbra trabalhavam a par e em complementaridade, quer em áreas só existentes num deles quer em áreas comuns, em que a possibilidade de troca de opiniões e a variedade de soluções apresentadas e executadas é um factor de enriquecimento de conhecimentos e de progresso clínico e científico. Numa cidade relativamente pequena, a concentração de escolas de saúde, de hospitais, de laboratórios de investigação, com o correspondente grande número de profissionais de saúde, formados e em formação, de investigadores, de professores, de estudantes, todos interagindo em proximidade uns com os outros, e de doentes procurando auxílio médico, na realidade traduzia a essência duma cidade universitária. Ambos os hospitais colaboravam no ensino pré-graduado e universitário, fornecendo a diversidade que é fundamental numa Universidade.

Eis senão quando, há dez anos atrás, o governo, sem estudo prévio e sem plano de execução, resolveu fundir os dois hospitais gerais centrais em Coimbra, e o CHC e o HUC passaram a ser um único, a que foi chamado centro hospitalar (CHUC). Quer dizer, de dois passou a haver apenas um, já que, como bem se sabe, o Hospital dos Covões foi progressivamente desactivado e esvaziado da capacidade que tinha instalada, levando às dificuldades de resposta clínica do CHUC sobejamente conhecidas de todos, e sentidas por muitos, utentes e profissionais, e que, em última análise, conduziram à Petição em apreço. E que foram reconhecidas e bem expostas por quase todos os deputados que tomaram a palavra na sua discussão no Parlamento, por isso dando razão aos peticionários e concordando com o peticionado: reverter a fusão levada a cabo, “devolver a autonomia ao Hospital dos Covões, como Hospital Geral Central”, para que possa voltar a desempenhar as suas funções enquanto tal. “Pelo direito ao acesso a cuidados de saúde de qualidade, porque o acesso à saúde é um direito e um dever."

Os deputados de seis partidos (PSD, CHEGA, PCP, BE, LIVRE, PAN) apoiaram expressamente a Petição, mostrando conhecer bem as condições de deterioração da Saúde em Coimbra e na Região Centro que da fusão resultaram, e concordando com a reversão desta.

A deputada da IL que interveio, embora compreendendo as razões apresentadas, e os problemas existentes em Coimbra na área da Saúde, e decorrentes da fusão hospitalar, entendeu que, para a sua correcção, haverá que fazer estudos e planos, em vez de simplesmente reverter o que deu origem aos maus resultados evidentes nas instituições hospitalares públicas. Isto é, na verdade a preocupação da Iniciativa Liberal será de avaliar as consequências da reversão da fusão, uma vez que esta não foi má para a iniciativa privada em saúde na cidade.

Mas houve um deputado que destoou destes todos: o do PS. Inesperadamente (digo eu, porque é deputado por Coimbra…), não reconheceu as dificuldades surgidas da redução de dois hospitais a um, falando antes dos investimentos do governo na saúde de Coimbra, dando como exemplo disso a construção de novas instalações dum centro de saúde para substituir as degradadas, e juntando-lhe o projecto de construção duma nova maternidade em cima do já esgotado HUC (com as consequências negativas que daí se esperam, aliás). E teve o desplante de falar nos “objectivos” duma fusão sem estudos nem plano prévios, que, disse ele, pretendia “melhorar a prestação de cuidados de saúde às populações”, quando foi precisamente por levar ao contrário disso que agora se pede que seja revertida! E a desfaçatez de dizer que a redução de dois hospitais a apenas um, com a consequente redução drástica de meios técnicos e humanos, veio contribuir “para a diversificação da oferta e acentuar a importância do ensino universitário e da investigação”!... E quis referir o que de novo se tem feito no Hospital dos Covões (?!), citando o bloco de ambulatório (que já existia antes da fusão, e que por acaso era único em Coimbra, já que o HUC não dispunha de nenhum), o Centro de Sono (com tantos anos de existência e de renome antes da fusão), o Centro de Audiologia ligado aos Implantes Cocleares (quando Implantes Cocleares foi sempre SÓ com os Covões, sem nunca se fazerem no HUC). Com o Serviço de Cardiologia esvaziado de doentes, é verdade que foi criada uma unidade de reabilitação cardíaca. E poderão fazer-se muitas mais coisas, como um lar para idosos ou um centro de dia, mas hospital geriátrico não, seguramente, a não ser que os Covões voltem a ser um hospital, porque agora não são!

Quer dizer, o deputado em questão, numa discussão que se queria séria, na procura da solução para um problema grave que aflige tanta gente na cidade que ele representa na Assembleia da República, limitou-se a repetir frases feitas que os conselhos de administração do CHUC foram propalando, sem se querer inteirar da realidade do assunto ou, pior, deturpando-a, numa intervenção meramente publicitária manifestamente encomendada. Mas mesmo neste desempenho não se preparou bem, não se actualizou na propaganda, já que se esqueceu de referir a celebrada recente “inauguração” da Consulta de Pé Diabético no Hospital dos Covões, que já lá existia há 30 anos!...  Mau serviço prestado à cidade e ao partido, cuja Comissão Política local, aliás, apoiou expressamente os peticionários e o peticionado.

Podiam avisá-lo? Ao PS. Mas ao PS nacional, ao de Lisboa, ao que manda nos outros, ao do governo. Ao que se mostra indiferente aos problemas locais, às dificuldades criadas, e aumentadas, e mantidas, por decisões de gestão governamental socialista desajustadas e mal implementadas, por gente que não percebe que as ordens que lhe estão a dar não vão colher bom resultado. Ou, pior, que não colheram bom resultado. E que é preciso verem quando se deve voltar atrás, reverter o que foi mal feito. Sem receio de assumir um erro que já há vários anos é óbvio para todos e que, a ser mantido, vai tornar mais evidente a incapacidade de quem o cometeu e o continua. Podem avisá-lo, por favor? É que esta teimosia, cheia de desculpas mal-alinhavadas, acabou de adquirir uma marca partidária. Contra todos. E contra Coimbra e a Região Centro. 

Carlos Manuel Costa Almeida