HISTÓRIA II: MADRE TERESA, A CASA HIV

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A Teresa, a Madre por ter pertencido a uma Congregação, de franciscanas (alguns colocam esta sua passagem em dúvida para mordiscar quem deixou Obra), também, a Granado, de apelido, era uma mulher para a frente e estava na frente do seu tempo.

Inteirava-se dos problemas que afligiam os seus próximos, especialmente as crianças e os jovens, como engravidar antes da idade aconselhada; como experimentar drogas e ficar dependente; como ser mãe sem ter a robustez etária, para tanto; como mentir para alcançar fins; como usar esquemas para perfurar os outros e a vida, atropelando amigos e conhecidos; como não conhecer os deveres para se fazer Cidadão; como não se manifestar grato pelas ajudas recebidas; como apedrejar a educação para se apresentar arrogante e a despropósito; como não reconhecer os defeitos de cada um e dos outros; e como não guardar amor e compaixão pelos outros, os doentes, os idosos, os mais desprotegidos e os que padecem com alguns males que a sociedade – sempre pronta a criticar sem pensar em acolher – não consegue estender a mão para dignificar.

Um dia, em que fui jantar à Comunidade, talvez por volta de 1988, dialogamos sobre um assunto melindroso à época. Chamava-se-lhe SIDA/AIDS, ainda (mais tarde HIV). Concedeu-me a novidade: “António, quero dizer-te que vou criar uma casa para acolher jovens com SIDA”.

Fiquei, por momentos, em silêncio, tomando o que acabara de me informar. Continuei a mastigar o jantar mas, e também, a notícia que me despejara, a querida Me. Teresa. Olhei-a. Penso que pressentiu que ia desbravar, nessa noite, esse tema, face ao que dissera.

Antes que tivesse oportunidade, atirou-me:”sei que não vai ser fácil, sei que vou receber “encontrões”, sei que serei verdascada com palavras azedas e montes de críticas, mas sei que tenho de dar a mão, compreendendo e ajudando, os que possam vir para a casa a edificar”.

Voltei a engolir, agora em seco. Que mulher de causas e de lutas, percebendo que tudo iria ser agreste e difícil. Lá me consegui recompor e não me contive:” a Madre merece a minha palavra de apreço e não terá a minha oposição. Tudo o que estiver ao meu alcance para desmistificar a doença e os seus portadores, assim como para os receber, estar com eles e dar-lhes conforto em atitudes modestas, pode contar comigo”. Por dentro, junto do coração, um arrepio sentido. E mais disse:”já sabe que os seus detractores e os que não a gramam (desculpe o palavrão) vão aproveitar para voltarem a crivar-lhe um monte de ferros, na tentativa de a desviarem desse seu percurso de humanidade e de serviço ao próximo. Não vacile, porque não precisamos de quem nada faz, mas dos que, em grande manifestação de amor, se dão e se entregam aos outros”. E conclui:”obrigado por mais esta sua lição de vida”.

Nem me deixou respirar:”António, nada disso… é o meu/nosso dever como pessoa e Cidadã, como mulher e como portuguesa, estar atenta às dificuldades, às de toda a ordem, dos que precisam…”.

Aconteceu, o que havia previsto. Caiu-lhe uma saraivada de “pedras”, criticando-a por estar a promover o espalhamento da SIDA na Comunidade de que era responsável e Directora; de transmitir a doença nas escolas que os doentes iriam frequentar; e de chancelar a Instituição com um arco da maior maleita que sacrificava gays e drogados.

O certo é que só acolheu, que me lembro, dois jovens e umas duas angolanas com filhos bebés. A casa que criou, acabaria, 2 anos mais tarde, por ser o tecto de africanas que vinham, a Coimbra, aos Hospitais, para se tratarem de enfermidades.

Mais uma vez recebia uma lição de generosidade, de bondade e de amor da minha querida amiga Teresa, a Madre e a Granado. Guardarei para sempre essas partilhas, porque me tornaram um homem mais capaz de tolerar e amar os outros. Bem-Hajas Teresa…

António Barreiros